Globalismo e as palavras

Estive discutindo com um amigo sobre globalismo, enquanto preparávamos um lanche da tarde. A conversa teve início após escutarmos uma paródia satírica que criticava uma personalidade da direita política. Na letra, veio o termo “globalismo” de forma rápida, de modo que, depois de termos acompanhado a música, surgiu-se uma dúvida.
“O
verso dizia ser contra ou a favor dos globalistas?” – perguntamo-nos. “A
favor”, respondi, “pois o indivíduo satirizado é liberal”. “Acho que não”,
contestou meu amigo, “Se ouvi bem, a canção deixa implícita certa rivalidade”.
Reproduzimos novamente a parte em questão. Não estava claro.
Mas
o que seria “globalismo”? Recorremos a um dicionário. Extraio as duas
principais acepções do Aulete:
“Interligação mundial por meio de redes de comunicação entre os países de todos
os continentes” e “Política nacional que visa o resto do mundo como espaço de
influência ou dominação política, econômica e cultural; INTERNACIONALISMO;
IMPERIALISMO”.
Sendo
assim, comentei: “Nitidamente, Donald Trump é globalista”. Entretanto, meu
companheiro não se deu por convencido. “Pesquise no buscador”. De fato, li que
o presidente americano é a favor da globalização, mas contra o globalismo. Enquanto a primeira se relaciona com o livre
comércio e com uma visão liberal de mercado, o segundo se refere a uma
concepção política de regulação, burocracia e intervencionismo.
Sem
empecilhos, lembrei-me dos poderes incríveis da semiótica social. Se eu e meu
amigo tivemos uma confusão a respeito desses significados, possivelmente esta
se dera porque socialmente construiu-se um desentendimento de definições.
Pensando
dessa forma, resolvi, pois, investigar os termos no contexto brasileiro. Li
algumas linhas de artigos de opinião: “Bolsonaro associa ‘globalismo’ a
‘marxismo cultural’” e “Governo comemora acordo do Mercosul como se fosse vitória
da globalização, enquanto é, por outro lado, do globalismo”.
Concluí
que, realmente, a sociedade alterou (ou até mesmo adulterou) os significados
tradicionais do termo explorado, presentes nos dicionários. Provavelmente, isso
ocorreu por causa de um fenômeno o qual chamo falta de parcimônia vocabular. Em
texto recente da revista Quatro cinco um,
apontou-se outra palavra vítima do excesso de uso: “polarização”.
Por
sorte, a discussão com meu amigo não se encaminhou para o assunto de se o globalismo
é bom ou ruim. Na verdade, convergiu para um misto (a comida). Com duas bocas
vazias, faz-se um diálogo; com uma cheia e uma vazia, um monólogo; com duas
cheias, silêncio. Ou seria o contrário?
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