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Mostrando postagens de março, 2022

Aforismos culinários

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1) Temperos falam de origens; caldas, de preferências; bebidas, de sentimentos. Cozinhar é conhecer-se. 2) Um vidro temperado não é um vidro condimentado. Uma colher de chá de açúcar não supõe a fervura prévia de uma água doce. Em culinária, assim como em poesia, é preciso atentar-se aos vários sentidos das palavras. 3) A sopa é uma forma especial de poesia concreta. 4) Receitas culinárias são textos inacabados, nos quais, quase sempre, há forte intertextualidade. Leitores assíduos de receitas culinárias também são, em geral, artistas experientes em paráfrase. 5) Ao se cortar um alimento, como um tomate, não é necessário render-lhe homenagens fúnebres. Neruda já o fez por nós, em suas Odas elementales . Mas é inevitável comover-se, mesmo sem cortejos, quando se assiste ao assassinato de uma cebola.  

A busca por uma identidade

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Começou no dia oito de dezembro do ano passado — uma quarta-feira — minha fastidiosa luta para tirar a segunda via da minha carteira de identidade. Ainda tenho a primeira via do documento, mas ela já é antiga — foi feita há mais de 7 anos —, e vinha, recentemente, gerando desconfiança em situações em que aquela pessoa da foto 3×4 (meu eu do passado) deveria corresponder à minha fisionomia do presente. Minha sorte é que também conto com uma carteira de trabalho e um passaporte, nos quais estou muito mais reconhecível. Contudo, a pouca praticidade de portar estes documentos, que se traduz em seus tamanhos volumosos, levou-me a buscar a segunda via do meu RG.   No final de novembro, pesquisando na internet , descobri, para minha surpresa, que cada estado brasileiro conta com um modelo diferente de carteira de identidade. Essa complicação conferiu certo sentido de urgência à minha necessidade, já que eu planejava me mudar para Campinas, no estado de São Paulo, em março deste ano — o qu

Em casa

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  Hoje cheguei a Campinas, de mudança. No caminho, quando da caminhonete dos meus pais avistei a grande metrópole ao longe, meus olhos viraram-se para trás, ingenuamente, a ver se Patos de Minas, minha terra natal, ainda se encontrava no horizonte. Para minha surpresa, lá estava ela, a contrariar qualquer racionalidade geográfica. Ali estava, mesmo que pequena, a serra próxima à casa dos meus pais, que já tanto subi nesta vida. Ali estava, ainda que escondida, a igreja dos capuchinhos entre duas avenidas, na qual tantas vezes já fui. Eu chegava a Campinas, no estado de São Paulo, mas tudo que era meu estava ali, a poucos quilômetros de distância: o distrito de Alagoas, onde estudei na infância; o IFTM, onde fiz meu ensino médio; o Parque do Mocambo, onde me encontrava com meus colegas.   Refletindo-se com indiferença, de fora, é possível afirmar que toda terra tem belezas e mazelas, que nenhuma localidade é mais interessante que outra, que nenhum sítio é mais ou menos especial. Com