Carta a um rio enfermo

Patos de Minas, 6 de julho de 2021.
 
Caro amigo Paranaíba,
 
Fiquei bastante triste quando soube, há alguns dias, que você estava infectado. Devido à pandemia, inicialmente, imaginei que você tivesse contraído a covid-19, já que ouvi relatos de que se notava certa falta de ar puro em alguns pontos de sua extensão. Contudo, logo percebi que você não havia sido infectado por um vírus, mas por dejetos humanos; dentre eles, ignorância, descompromisso e irresponsabilidade.
 
No mês passado, cheguei a fotografar suas bonitas formas com meu drone, enquanto um apaixonante pôr do sol se exibia no horizonte. Confesso que não prestei muita atenção, naquele dia, às suas cores. Nós, seres humanos, mudamos de cor dependendo de nosso estado de saúde e de nossas emoções. Podemos ficar pálidos, avermelhados ou amarelados, por exemplo. Sei que os rios também mudam de cor por uma série de fatores diferentes. Dentre eles, o motivo de sua enfermidade.
 
Com efeito, o que tenho lido no noticiário e escutado nas falas dos vereadores de nossa cidade é que você está sendo contaminado de forma irresponsável — e criminosa, eu diria — por toda a imundície humana, material e imaterial, que o povo de Patos de Minas tem a oferecer.
 
Entretanto — sei o quão pode ser inconveniente pedir favores a enfermos —, em meio a sua grave enfermidade, venho lhe pedir que não pense que a população patense é a única responsável por lhe transmitir a doença da desumanidade, a poluição. Parte da culpa, de fato, é nossa. Somos particularmente responsáveis pelo lixo que expelimos de forma não íntima: as postagens que compartilhamos nas redes sociais contrárias à natureza; o plástico que jogamos sem qualquer pudor nas ruas; a água sendo desperdiçada ao lavarmos nossas calçadas. Tudo isso, bem sei, é sentido por você.
 
Por outro lado, nossos lixos íntimos, que produzimos na privacidade do interior de nossos lares, não deveriam ser, a princípio, remetidos a você sem um tratamento adequado. Acredite: pagamos caro por um tratamento que não existe. A companhia de saneamento que atua em nossa cidade deveria estar desempenhando com eficiência e eficácia o papel à qual lhe compete. Todavia, as dezenas de pontos de descarte em você revelam justamente o contrário.
 
Mas, não se desespere (aqui vai uma palavra amiga): sua doença não é incurável e seu quadro não é irreversível. Além de enviar a você a carta que agora escrevo, comprometo-me a publicá-la em meu blogue e em minhas redes sociais, a fim de buscar mais pessoas que possam cooperar para a sua recuperação. Unidos, tenho a esperança de conseguirmos lhe curar e, assim, também nos curar.
 
Com a carta, também envio a você a foto que comentei. Note como você ficou bonito nela.
 
Abraço,
 
Teófilo


 

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