De volta à música
Após algumas semanas de
silêncio, volto a escutar música. Há uma tirinha de Laerte muito interessante,
em que um personagem diz buscar o silêncio porque gosta muito de música. Nos
últimos dias, substituí notas por anotações, andamentos por tropeços, sóis por
luas, fás por faltas e dós por compaixões. Restaram as fiéis e métricas pausas.
A verdade é que quase ninguém
consegue ser fortíssimo por muito tempo. Nem mesmo forte. Muito menos piano. Há
algo mais desnecessário do que um piano quando se quer silêncio? Já escreveu
Alberto Caeiro: “Para que é preciso ter
um piano?/O melhor é ter ouvidos/E amar a Natureza.” Nesses dias que passaram,
meu teclado virou uma escrivaninha. Com efeito, é da minha Natureza espalhar papéis,
livros... criar bagunças. Meu mundo é sempre como o de Caetano: fora da ordem.
O xadrez de notas brancas e pretas serviu bem como mesa, ainda que demasiado estreita.
Acontece que nem só de
silêncio vive o homem. Até mesmo os religiosos e as religiosas que fazem voto
de silêncio têm intensa comunicação e diálogo — com o divino e consigo.
Silêncio, quando é demais, ensurdece. Por isso, volto às canções de antes como
quem precisa respirá-las e bebê-las com alguma urgência existencial.
Mas, o que escutar
primeiro? — foi a minha dúvida. Decidi começar com o que escutei por último,
antes da longa pausa. Às vezes, em uma música, finda uma pausa, volta-se ao
refrão. Comecei por Jorge
Drexler: “Y el péndulo viene y va,/y
vuelve a venir e irse”. Depois, Mercedes
Sosa: “Si no canto lo que siento/me voy a
morir por dentro”. Então, Marília Pêra: “Também
já se viu/em terras destruídas/renascer mais trigo/que no melhor abril”.
Empolguei-me com os
ritmos e acordes; rejuvenesci-me. Alegrei-me ainda mais quando consegui
descobrir o nome de uma canção que estava em minha cabeça há, pelo menos,
quatro anos: “Chipi chipi” — porém, não consegui identificar a autoria. Como é
angustiante tentar lembrar ou procurar o nome de algo e não conseguir! Trata-se
de uma faixa que apareceu em um filme sobre a vida de Che Guevara, ao qual
assisti quando eu ainda estava no ensino fundamental. Os tempos eram outros!
Termino a escrita desta
crônica escutando uma interpretação magnífica de Bibi Ferreira da canção “My
way”, eternizada na voz de Frank Sinatra. “And
did it my way”... Agora, tentarei arriscar algo na flauta de bambu. Talvez
um condor passe por aqui.
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