Subida ao inferno

Eu
estava desorientado. Caminhei, sem atravessar portões, pelo perímetro do local
que, a mim, era pouco familiar. Só havia uma entrada aberta. Olhei meus
arredores: não se achegavam pessoas conhecidas. Por um momento, pensei ter avistado
uma amiga, mas não se passara de um vulto qualquer.
Decidido,
atravessei o portão, que por sua vez já se encontrava descerrado. Tudo estava
deserto. Placas indicaram-me o caminho que eu deveria seguir – nelas,
exibiam-se negras setas. Após um pouco andar, deparei-me com escadas – que
ascendiam. Pensei, por certo, que algo sublime estaria prestes a acontecer.
No
fim dos degraus, jazia uma porta fechada. Alguns humanos esperavam, como eu,
externamente. A porta oferecia pouca resistência ao som; eu ouvia gritos e
risadas oriundas de seu outro lado. Passei a escutá-los com atenção. A maioria
eram frutos de ordens: “Quando eu liberar a entrada, escondam-se!”.
A
porta abriu-se levemente. Saiu uma mulher de dentro. Vestia preto. Levava alguns
nomes consigo. Voltei meu olhar para minhas mãos e vi que nelas eu trazia uma
oferta. Sem longos diálogos, entreguei-a à moça, que sorriu e guardou-a ao seu
lado. Olhei para trás. Reconheci alguns amigos. O que estariam fazendo ali?
Estavam ainda na escada, em altura menor que a minha. Acenei a eles.
Percebi,
então, que já se formava enorme fila na escadaria que subi. Ia do primeiro
degrau ao último, de modo que eu não conseguia enxergar quem estava em seu “miolo”.
Eu, ruim em estimativas, estava incerto de quantas pessoas ali estavam;
contudo, verifiquei que eram muitas.
Enfim,
um homem barbudo espiou através de uma fresta e disse à mulher que liberasse a
entrada. A porta foi aberta. Fui o primeiro a entrar. No outro plano,
deparei-me com um local escuro e silencioso, voltado para um tablado ornado de
modo a incutir medo e assombro.
Imóvel
e próxima ao tablado, uma mulher de muitas vivências estava sentada. Aparentemente,
fitava-o de maneira hipnotizada, pois permanecia sem quaisquer respostas ao
movimento de pessoas a adentrarem ruidosamente o sombrio recinto. Em passos
leves, resolvi aproximar-me. Reconheci-a. Era minha amiga Consuelo; abracei-a e
sentei-me ao seu lado. Todos tomaram assento. Algo grande estava prestes a
acontecer.
De
forma repentina, um demônio começou a causar alvoroço no ambiente; surgira
ninguém sabe de onde, e pôs-se a saltar do corpo de uma pessoa à outra. Por
fim, subiu ao tablado. Veio, então, o próprio diabo, com chifres e pele suada.
Estava furioso, mas com grandes expectativas de que muitas almas embarcassem
com ele para o inferno. Estremeci.
Esta
crônica é um relato de minha ida à peça teatral Auto da barca do inferno, encenada pelo grupo Primeiro Ato em
quinze de setembro de dois mil e dezenove, no colégio Marista, em Patos de Minas.
Os amigos que encontrei nas escadas foram Daniela, Renata, Márcia e Érick. Até
o presente momento em que escrevo, informo que nenhum de nós pretende embarcar
em viagem infernal.
Comentários
Postar um comentário